Bandeira erra ao dizer que economia gaúcha nunca cresceu 5% por quatro anos seguidos
Última vez que isso ocorreu, no entanto, foi no final dos anos 1970. Candidato do Novo citou o dado ao comentar projeções de recuperação fiscal do estado
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“O Rio Grande do Sul nunca cresceu 5% ao ano, em média, num período de quatro anos”, Mateus Bandeira (Novo), em sabatina no Painel Eleitoral.
Ex-servidor da Fazenda estadual e pós-graduado em Finanças e Gestão, Mateus Bandeira (Novo) aposta nos conhecimentos contábeis para se destacar nesta eleição, que é a primeira de seu partido.
Não foi diferente no Painel Eleitoral realizado pela Associação Riograndense de Imprensa (ARI), em 31 de agosto. “Nem no cenário mais otimista da Secretaria da Fazenda, que prevê crescimento de 5% ao ano no Rio Grande do Sul – o Rio Grande do Sul nunca cresceu 5% ao ano em média num período de quatro anos – nem aí é possível encontrar o equilíbrio [das contas]”, disse o candidato.
O Truco nos Estados – projeto de checagem de fatos da Agência Pública, feito no Rio Grande do Sul em parceria com o Filtro Fact-checking – verificou que Bandeira errou ao dizer que o PIB gaúcho nunca cresceu nesse patamar por quatro anos consecutivos ou mais. A última vez que isso aconteceu foi no final dos anos 1970.
No contexto da frase, há ainda outra imprecisão: o cálculo dos economistas do governo leva em conta o PIB nacional, e não o estadual.
A projeção citada por Bandeira consta em um estudo feito por técnicos da Secretaria da Fazenda, em maio deste ano. O texto foi comentado na coluna de Política do jornal Zero Hora em junho. Na análise intitulada “Perspectivas para as finanças públicas do RS no período de 2019 a 2025”, os economistas Guilherme Petry, Jacó Braatz e Paolo Martinez fazem projeções para as finanças públicas em conjunturas econômicas “pessimista, realista e otimista”. O cenário otimista considera um crescimento (fictício) do PIB nacional de 5% ao ano e uma inflação anual de 7%.
Ainda que Bandeira tenha se equivocado ao mencionar o crescimento de 5% ao ano no Rio Grande do Sul como parâmetro – enquanto o estudo toma o PIB nacional – a análise dos economistas em suas considerações finais confirma o que disse o candidato do Novo: “Conforme demonstrado, uma possível recuperação do crescimento econômico, mesmo que em níveis jamais vistos, será insuficiente para que as finanças públicas sejam administráveis, pelo menos nos próximos oito anos”.
O PIB no Brasil e no RS
A série histórica do PIB gaúcho, sistematizada pela extinta Fundação de Economia e Estatística até 2017 com dados de 1947 a 2016, mostra que a última vez que o Rio Grande do Sul cresceu 5% ao ano por quatro anos consecutivos (ou mais) foi no final dos anos 1970. O histórico recente é de crescimento baixo – e até de variação negativa.
Professor de Economia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Gustavo de Moraes chama atenção para o fato de que, até os anos 1970, quando a FEE foi criada, não existiam estatísticas sobre o PIB regional. “A comparação para trás é uma estimativa feita com base no PIB nacional, devido à ausência de dados para o contexto regional. Havia apenas números industriais, não se tinha estatísticas agrícolas e de serviços consolidadas”, explica.
A própria FEE, em suas notas metodológicas, informa que “as séries do Produto Interno Bruto (PIB) do Rio Grande do Sul foram elaboradas por uma metodologia própria da Fundação de Economia e Estatística (FEE) até o ano de 1985. A partir desse ano, as estimativas das Contas Regionais do Estado e das demais 26 unidades da Federação são desenvolvidas pela FEE e pelas demais instituições estaduais, em conjunto e sob a coordenação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)”.
O IBGE também mudou o método de cálculo em 1985 e depois em 1995. Os dados até 1970, inclusive, eram gerados pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Depois, houve mudanças no cálculo do IBGE para agregar novos setores e indicadores a fim de aperfeiçoar a investigação a partir de novas bases de dados. Essas quebras metodológicas, segundo o professor da PUCRS, dificultam a comparação no conjunto da série histórica.
Feita essa ressalva, Moraes pontua que o crescimento da economia – gaúcha e brasileira – na escala mais otimista projetada pela Fazenda não ocorre desde o “milagre econômico”, no período militar, com o petróleo em alta, investimento em energia, indústria e grandes obras de infraestrutura.
Os números confirmam: de 1947 até 2016, o RS teve crescimento acima de 5% por quatro anos consecutivos ou mais entre 1949 e 1955, de 1958 a 1962 e de 1968 a 1976, segundo os dados da FEE. Na série histórica do PIB nacional disponibilizada pelo IBGE, também desde 1947, a tendência se repete: entre 1957 e 1962 e de 1968 a 1976, o PIB brasileiro cresceu mais de 5% de forma continuada.
Crescimento pontual
Desde o fim dos anos 1970, houve períodos isolados com crescimento nesse patamar no RS em 1992 (+7,2%) e em 1993 (+9,6%). Chama atenção que no cenário nacional o período foi de recessão: o PIB brasileiro teve variação de -0,5% em 1992.
“Em 1992, o Rio Grande do Sul volta de um ano de seca, o que explica grande parte do movimento na agropecuária, que era ainda mais relevante na época”, comenta Moraes. De fato, em 1991, o PIB gaúcho sofreu uma queda de -3,4%. A recuperação das lavouras no ano seguinte, naturalmente puxou o resultado para cima. Ainda hoje, o setor agropecuário responde por 8,5% do PIB gaúcho.
Além da recuperação da seca, o RS recebia investimentos na perspectiva do Mercosul, finalizado no governo de José Sarney (1985-1990). “Imaginava-se que o estado seria um grande hub de comércio na região, depois isso acaba não se materializando”, lembra o professor.
Após a implementação do Plano Real, em 1994, o estado teve uma variação positiva superior a 5% em 1997 (+5,9%), em 2007 (+6,7%), em 2010 (+6,9%) e em 2013 (+8,5%), mas também foram resultados isolados. O PIB nacional registrou picos de aumento de 5,8% em 1994 e 2004, depois cresceu 6,1% em 2007, e atingiu o “pibão” de 7,5% em 2010. Logo na sequência, o desempenho econômico brasileiro caiu drasticamente, com variação negativa em 2015 e 2016, até crescer 1% em 2017.
Chama atenção no histórico recente o crescimento do PIB gaúcho de 8,5% em 2013 – enquanto a economia nacional cresceu somente 3%. “Em 2012, houve uma seca muito severa. O PIB caiu 2%. Ao natural, o PIB de 2013 vai crescer, mas foi um resultado pontual”, analisa Moraes. Já em 2014, o PIB estadual apresentou variação negativa de -0,3%, o que se repetiu em 2015 (-4,6%) e em 2016 (-2,9%). Com a extinção da FEE, o PIB de 2017 foi calculado pela Fipe, e registrou crescimento de 1% – mesmo patamar do PIB nacional.
Diante desse cenário, Gustavo de Moraes endossa a análise dos economistas da Fazenda estadual: “Eles próprios afirmam que é difícil isso [crescimento de 5% ao ano] acontecer. Esse é um padrão de crescimento chinês. É bastante improvável”.
No ranking do instituto Austin Rating, que leva em conta o PIB de 2017 em 45 países, o Brasil ficou em último lugar. No topo, estão Romênia, China e Filipinas, com crescimento acima de 6%.
A assessoria do candidato foi comunicada sobre o selo atribuído a declaração, mas não se manifestou até a publicação da checagem.
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