Doria diz que pagou viagens internacionais, mas não prova
Prestações de contas detalhadas de quando candidato era prefeito de São Paulo não estão disponíveis, o que impede a verificação dos dados
“Paguei todas [as viagens internacionais enquanto prefeito] com o meu dinheiro. Não viajei com um centavo [público] nem comprando bilhete aéreo, nem transfer, hospedagem, alimentação, nada.” – João Doria (PSDB), em entrevista à rádio Eldorado no dia 3 de agosto.
João Doria (PSDB) foi prefeito de São Paulo de 1º de janeiro de 2017 até 6 de abril de 2018. Durante seu mandato, realizou diversas viagens para participar de eventos em outras cidades brasileiras e fora do país. Não há fontes documentais disponíveis para consulta pública que permitam verificar com absoluta certeza que as viagens foram custeadas pelo próprio Doria – existe a chance de terem sido patrocinadas por empresas ou organizações que o convidaram, por exemplo. Por isso, o Truco – projeto de fact-checking da Agência Pública – classificou a afirmação do candidato como impossível de provar.
A prática de viajar constantemente rendeu notícias da imprensa, que motivaram o Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores (PT) a solicitar uma apuração do Ministério Público de São Paulo. O site G1 apurou em novembro de 2017 que Doria havia feito 43 viagens em 11 meses de mandato. O diretório do PT apontava que o então prefeito poderia estar utilizando recursos públicos para promoção pessoal, com gastos de deslocamentos para aeroportos, agendamento de reuniões e participação de funcionários e servidores públicos nas viagens. Isso configuraria conflito de interesses e irregularidades na gestão pública.
O que diz o Ministério Público
O Ministério Público então pediu esclarecimentos ao ex-prefeito. Ao MP, Doria afirmou que as viagens faziam parte da agenda oficial de governo, de compromissos assumidos enquanto agente público e vice-presidente de relações institucionais da Frente Nacional de Prefeitos (FNP). O candidato também enviou ao Ministério Público documentações que indicavam doações e termos de cooperação assinados com empresas, como resultado da agenda de governo e de articulações políticas. Doria respondeu ao MP que a agenda seguia o plano de governo do ex-prefeito e o Programa de Metas da cidade de São Paulo, que prevê 48 ações de cooperação internacional até 2020.
Especificamente sobre gastos das viagens, o Ministério Público recebeu uma explicação do ex-prefeito com informações sobre datas, destinos, motivações e condições de realização de dez viagens feitas por ele. Ele afirmou que os transportes ocorreram com aeronaves de terceiros, cujos custos foram cobertos pelo patrimônio pessoal do ex-prefeito. Para isso, o promotor descreve que as informações foram apresentadas em tabelas.
De acordo com as conclusões do promotor, não havia provas que confirmassem as suspeitas do diretório municipal do PT em São Paulo. Ele considerou que não houve danos aos recursos públicos e que a função de prefeito, de acordo com especialistas, não tem as obrigações do cumprimento da jornada de trabalho como um servidor público comum. Segundo Milani, Doria também não ultrapassou o limite de 15 dias fora por viagem, estipulado pela Lei Orgânica do Município.
O texto em que Milani pede o arquivamento do pedido de investigação sobre as viagens de Dória, porém, não traz a lista completa das viagens realizadas pelo ex-prefeito em seu mandato, nem apresenta as prestações de contas (planilhas de orçamento das viagens e notas fiscais, por exemplo). Estas informações não se tornaram públicas.
Além disso, o ex-prefeito indicou informações apenas sobre dez viagens ao Ministério Público, enquanto os deslocamentos realizados ultrapassariam essa quantidade (até onde apurou o G1, teriam sido 43). Em matéria publicada em dezembro de 2017, o G1 indicava 11 destas como atividades do Lide, grupo de empresas fundado por Doria.
Outras viagens
Há também viagens realizadas como parte da política de cooperação nacional e internacional da prefeitura de São Paulo, conforme indicado nas respostas de Doria ao Ministério Público. Sobre estas, seria necessário verificar as atividades do prefeito em cada viagem – se ele reuniu-se somente para fins da agenda pública ou também se realizou atividades e reuniões de cunho privado.
Em resposta ao Truco, a assessoria de imprensa do candidato deu como fonte da afirmação a declaração de bens de Doria, que provam que ele é publicamente rico e pode arcar com os custos das viagens. O candidato ao governo do estado de São Paulo declarou mais de R$ 189 milhões em bens para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O Truco também entrou em contato com a assessoria de imprensa da prefeitura de São Paulo para saber quais viagens foram realizadas por Doria enquanto prefeito e como foram pagas. “Todas as viagens do ex-prefeito foram publicadas no Diário Oficial, sendo, portanto, informações de acesso público, e nenhuma foi custeada com recursos públicos”, informou a assessoria da prefeitura.
Os registros no Diário Oficial da Cidade de São Paulo trazem os comunicados de Doria a respeito de suas viagens à presidência da Câmara Municipal de São Paulo (comandada pelo vereador Milton Leite, do DEM), como estabelece a regra. Os comunicados afirmam “que a viagem será feita sem custos para a Cidade”. A assessoria de imprensa da Câmara Municipal explicou ao Truco que o prefeito não é obrigado legalmente a prestar contas da viagem – deve apenas comunicar à Casa quando viaja para o exterior.
No dia 11 de outubro de 2017, o gabinete do ex-prefeito comunicou uma viagem — “sem custos para a Cidade”– do dia 12 ao 14 daquele mês para a Itália. Nela, estaria em missão oficial, com o prefeito de Milão e empresários italianos, e assinaria um protocolo cultural entre Veneza e São Paulo.
Também iria palestrar na Universidade Bocconi, focada em estudos socioeconômicos em Milão, participar de um debate no Istituto Per Gli Studi di Politica Internazionale (ISPI) – um think thank italiano de pesquisas e análises sócio-políticas e econômicas – e de um painel em evento promovido pela Greenmantle, uma consultoria macroeconômica e geopolítica para “um grupo seleto e estritamente limitado de clientes nos setores de energia, financeiro, industrial e de tecnologia”, como informa seu site.
Outros funcionários
Há no Diário Oficial os registros de várias outras viagens de servidores municipais, secretários, secretárias e outros funcionários que viajaram para eventos e seminários de interesses de suas pastas, com custos para a administração municipal e sem custos. Em alguns casos, estes funcionários acompanharam Doria nas suas viagens, com ônus.
Foi registrado no dia 25 de novembro, por exemplo, o repasse de R$ 1.423,62 para cobertura de despesas com diárias de um capitão da Polícia Militar que foi à Itália realizar planejamento de segurança e visitas aos locais onde o ex-prefeito iria passar. Nos casos em que há gastos, é registrado o nome da pessoa que viajou, seu CPF, informações sobre o cargo, o motivo da viagem, os custos e são citadas as comprovações que geraram reembolso ou cobertura dos gastos.
Após ser comunicada sobre o selo, a assessoria de imprensa de Doria não enviou resposta no prazo determinado.
Márcio França exagera desconto em pedágios
Governador afirmou que a tarifa diminuiu até 25% com novas concessões, mas na verdade o porcentual chega a 20%
Doria exagera criação de vagas em creches quando foi prefeito
Durante os 15 meses em que administrou a cidade de São Paulo foram criadas cerca de 25 mil vagas, não 42 mil
França erra taxa atual de crescimento da economia paulista
Produto Interno Bruto do estado não evolui 6% ao ano, como afirmou o governador